Além de Israel x Hamas: Qual foi a posição do Brasil em outras guerras

Após os primeiros dias da invasão de Israel ao território da Faixa de Gaza, o Brasil já tem firmada a sua posição de “neutralidade” diante do conflito. Historicamente, essa postura é assumida pela diplomacia brasileira diante de impasses internacionais.

Isso, por muitas vezes, desperta a amargura dos americanos, europeus e, especialmente, os ucranianos. Para ilustrar essa situação, o Blog vai relatar o comportamento brasileiro diante dos principais conflitos do século XX e XXI.

Segunda Guerra Mundial

Getúlio Vargas e Roosevelt

Na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o Brasil estava sendo liderado por Getúlio Vargas com uma postura de neutralidade no início do conflito, gerando uma narrativa pela qual Vargas era aliado da Alemanha Nazista e da Itália Fascista.

Na época, Vargas ascendia ao poder pela Revolução de 30 e começava estabelecer uma série de transformações sociais e econômicas no Brasil. Para avançar nas questões econômicas o governo brasileiro necessitava de apoio das potências econômicas e Getúlio Vargas conseguiu manter o Brasil economicamente e diplomaticamente neutro.

Com o desenrolar da Guerra as pressões internas e externas para o Brasil entrar no conflito ao lado dos aliados se intensificavam. Externamente os Estados Unidos pressionam o Brasil para ingressar no conflito oferecendo apoio econômico.

Internamente, elites econômicas, movimentos de estudantes e demais setores da sociedade pressionavam o governo para entrada na Guerra. Os comunistas entusiasmados com o combate ao nazi-fascismo, já que vinham enfrentando os integralistas, também desejavam a entrada do Brasil na Segunda Guerra, pois junto com os aliados estava a União Soviética.

Em 22 de agosto de 1942 após ataques de submarinos alemães navios da Marinha Mercante brasileira, o Brasil se viu na obrigação de declarar apoio aos aliados, mas com contrapartidas econômicas. Roosevelt negociou com Vargas e se encontraram em Natal, Rio Grande do Norte, onde trataram da colaboração no esforço de guerra e outros assuntos como incremento da produção da borracha na Amazônia, fundamental para a fabricação de material bélico pelos Estados Unidos.

O Nordeste era estratégico geograficamente para as operações militares no norte da África, por isso fundamental a utilização do Porto de Natal e da Ilha de Fernando de Noronha. E o governo Getúlio Vargas usou esse trunfo para obter uma importante vantagem econômica: a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). A CSN ficava localizada em Volta Redonda considerada o berço da industrialização nacional.

A Força Expedicionária Brasileira (FEB) é criada com os “pracinhas”, que desembarcaram na Europa em Julho de 1944, ajudando os estadunidenses na libertação da Itália frente aos exércitos da Alemanha Nazista. O símbolo da FEB era uma cobra fumando, devido a uma anedota que era mais fácil uma cobrar fumar do que o Brasil entrar na guerra. Os aliados derrotam as forças nazi-fascistas e os soldados brasileiros retornam ao Brasil “americanizados”, questionando o autoritarismo do Estado Novo.

Getúlio Vargas demostrou a atitude que um chefe de estado deve praticar perante um conflito de proporções mundiais. Entrou na guerra com os aliados garantido conquistas enconômicas para o Brasil e pela necessidade de combater o nazismo.

A neutralidade nos primeiros anos de guerra foi devido a necessidade de o Brasil manter negócios com as grandes potências de ambos os lados.

Guerra das Malvinas

Guerra nas Malvinas aconteceu em 1982

O presidente João Baptista Figueiredo ameaçou apoiar Argentina militarmente se os britânicos a invadissem, durante a Guerra das Malvinas. O jornal Estadão, que teve acesso a um documento inédito, narra dois encontros em maio de 1982 entre o general Figueiredo, e dos EUA, Ronald Reagan.

O documento foi do Conselho de Segurança Nacional, guardado no Arquivo Nacional, em Brasília, e tem a rara classificação de “ultrassecreto”.

Em 11 de maio, na primeira conversa, na Blair House – a casa de hóspede oficial do presidente dos EUA –, Figueiredo encontra Haig, numa preparação para a reunião presidencial, dois dias depois, com Reagan. Tanto ele quanto Haig lamentam pelo conflito militar.

Mas Figueiredo aconselha que os britânicos terminassem por combater em solo continental, em vez de apenas no Arquipélago das Malvinas. Do contrário, as consequências poderiam ser muito piores.

O general brasileiro dá a entender que essa situação não seria aceita na América do Sul e o Brasil poderia até mesmo se posicionar militarmente ao lado dos vizinhos.

Antes de terminar a reunião, Haig perguntou a Figueiredo se “haveria algo que pudesse dizer ao presidente Ronald Reagan” como preparação para o encontro com o presidente estadunidense. Conforme o relato informado pelo Estadão, “o presidente Figueiredo, em resposta, disse que só tinha uma preocupação, qual seja a do fato consumado de que a Inglaterra promova ação no continente, o que teria repercussões desastrosas na América do Sul”. O documento deixa claro que “o presidente Figueiredo assinalou a necessidade de que essa hipótese seja evitada a todo custo”.

O receio brasileiro era que um ataque desse tipo, representando invasão de território sul-americano por um país europeu, provocasse forte reação popular contrária.  Segundo o relato do encontro, feito pela inteligência do Exército brasileiro, o presidente Figueiredo afirmou que, para o Brasil, “a situação é extremamente penosa”. “Pois não se pode avaliar até que ponto se pode conter a opinião pública. Se ocorrer o pior, a solidariedade americana certamente eclodirá”, cita o texto. “Que a Inglaterra não chegue a esse ponto, pois seria muito delicado”, diz o documento.

Além disso, o estadão relata que o governo brasileiro temia que os soviéticos apoiassem a Argentina até mesmo com seu programa nuclear, fornecendo urânio enriquecido.

Conforme o relato do encontro, Haig “confirmou que a URSS estava jogando a longo prazo (sic)”. Figueiredo concordou e afirmou que “quem estava lucrando era exatamente a União Soviética”. E defendeu que “não se pode perder a Argentina para a causa do Ocidente e este objetivo somente seria realizável desde que o regime argentino não se desestabilizasse”. Na conversa, o presidente brasileiro afirma que seu medo era que o governo argentino caísse “nas mãos dos peronistas, como aliados dos comunistas, que dele posteriormente tomariam conta”.  Para Figueiredo, essa combinação poderia ocasionar “uma Cuba muito maior”.

Guerra do Iraque

Bush com soldados norte-americanos

O Brasil manteve posição de neutralidade durante a Guerra do Golfo, diferentemente da Argentina, que se alinhou incondicionalmente a Washington. Na época do conflito, o presidente Fernando Collor de Mello concordou com as resoluções da ONU, mas manteve uma porta aberta ao Iraque. O país não enviou tropas ao Golfo Pérsico. Sua única medida foi suspender a venda de armas a Saddam Hussein.

A falta do apoio brasileiro à aliança foi motivo de críticas públicas do Departamento de Estado norte-americano. Os EUA classificaram o Brasil como “a Jordânia da América Latina”. A diplomacia jordaniana é famosa por evitar tomar partido, na busca de aliados dos dois lados do conflito.

Com a continuação do conflito em 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou claro, durante reunião e almoço de trabalho com o presidente da França, Jacques Chirac, a posição contrária à possibilidade de um apoio ao conflito.

Segundo o presidente, embora o Brasil seja solidário ao sofrimento norte-americano, após os atentados de 11 de setembro, a única maneira de preservar a democracia e as organizações internacionais é evitar a guerra. “Nada deverá ser feito fora do Conselho de Segurança da ONU, ainda que os inspetores tenham dúvidas sobre o que encontraram. Precisamos de cautela e tranquilidade”, enfatizou Lula.

Na opinião do presidente brasileiro, “um cidadão pode cometer uma loucura qualquer, um Estado não”, afirmou referindo-se à postura dos Estados Unidos no caso do Iraque.

Lula lembrou ainda que sua campanha eleitoral foi “paz e amor” e não será agora que ele irá defender a guerra. O presidente da França, Jacques Chirac, disse que a postura do Brasil e do seu país sobre a guerra “não são próximas, mas idênticas”.

Ainda por cima, Lula disse que o ex-presidente dos Estados Unidos George Bush tentou convencê-lo a aprovar a entrada direta do Brasil na guerra.

“Em fui visitar o Bush e ele veio com uma preleção de 40 minutos me mostrando o quão importante era acabar com o terrorismo. Isso fazendo um apelo para que o Brasil participasse do que ele chamou de luta extraordinária para acabar com o terrorismo, invadindo o Iraque. Eu simplesmente disse para ele: eu não conheço Saddam Hussein”, disse.

Além disso, Lula, cmentou que o Iraque ficava muito longe do Brasil e ele já enfrentava outra guerra. “Eu tive outra guerra: a fome. No meu país, a fome atingia 54 milhões de pessoas. E essa guerra eu iria fazer e iria ganhar”, completou.

Conflito russo-ucraniano

Apesar da posição neutra com relação a invasão da Ucrânia pela Rússia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) trataram o conflito de formas diferentes.

Antes dos ataques russos, Bolsonaro viajou para Moscou em busca de acordos envolvendo fertilizantes para o agronegócio brasileiro. A visita recebeu críticas da comunidade internacional, principalmente dos Estados Unidos.

Bolsonaro em visita a Putin

Na viagem, Bolsonaro expressou sua “solidariedade” à Rússia e chegou a repetir, publicamente, os motivos citados por aquele país para justificar a invasão da Ucrânia — sinalizando, apesar da imparcialidade defendida pelo Itamaraty, apoio à posição de Putin.

“Ele [Putin] está se empenhando ali em duas regiões do sul da Ucrânia que, em referendo, 90% da população quer se tornar independente e se aproximar da Rússia”, disse Bolsonaro. “Essas questões são particulares, a própria Ucrânia nasceu de um referendo e nós aqui assistimos ao desfecho desse embate. O que a Rússia quer é a independência dessas duas áreas”, acrescentou o então presidente.

“O momento em que o presidente do Brasil se solidarizou com a Rússia, enquanto as forças russas estão se preparando para, potencialmente, lançar ataques a cidades ucranianas, não poderia ser pior”, declarou o Departamento de Estado norte-americano na ocasião.

Meses depois, o conflito voltou a ser abordado por Bolsonaro, desta vez na Assembleia Geral da ONU, em Nova York.

Em seu discurso de abertura, ele defendeu um cessar-fogo imediato, mas criticou a adoção das sanções econômicas impostas à Rússia.

“Não acreditamos que o melhor caminho seja a adoção de sanções unilaterais e seletivas, contrárias ao direito internacional. Essas medidas têm prejudicado a retomada da economia e afetado direitos humanos de populações vulneráveis, inclusive em países da própria Europa”, argumentou.

Com a entrada de Lula na presidência, o Brasil manteve a posição de neutralidade, mas com uma visão diferente de governos ocidentais aliados aos Estados Unidos, que responsabilizam apenas os russos pela guerra.

Lula não declarou apoio à Ucrânia. Na campanha eleitoral, ele falou que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, era tão culpado pelo conflito, no leste europeu, quanto o mandatário russo.

“Vejo o presidente da Ucrânia na televisão como se estivesse festejando, sendo aplaudido de pé por todos os parlamentos. Esse cara é tão responsável quanto Putin, porque numa guerra não tem apenas um culpado”, afirmou Lula, em entrevista à revista Time.

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, se reuniu com seu homólogo russo, Sergey Lavrov

Já no comando da presidência, o petista mudou o tom. Recentemente em entrevista a CNN Internacional, ele disse que a Rússia cometeu um “erro histórico” de promover a invasão ao território ucraniano e, em notas conjuntas com outros governos, o Brasil passou a aceitar o fato de que o agressor é o governo de Putin.

Lula, porém, tem reforçado o posicionamento de não se envolver no conflito, de maneira prática. Em encontro com o chanceler alemão Olaf Scholz, em janeiro, Lula reiterou que não deve enviar munições para os ucranianos.

Macron tem se mostrado aliado do presidente brasileiro na ideia da criação de um grupo para mediar os diálogos de paz entre Rússia e Ucrânia. O petista apresentou ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, a proposta de formação de um “G20 pela paz”. Ele seria formado por países que não têm relação direta com o conflito, como Brasil, China, Índia, México e Indonésia.

A neutralidade do Brasil, porém, chegou a ser criticada pelo líder da Ucrânia — ainda na gestão de Bolsonaro. “Não se pode ficar neutro, não se pode dizer ‘serei um mediador’; um mediador de quê? Entre quem? A guerra não é entre a Rússia e a Ucrânia, é a guerra da Rússia contra o povo da Ucrânia”, disse. “Se alguém capturar sua terra, matar seu povo, estuprar suas mulheres, torturar suas crianças, como posso dizer que sou neutro?” declarou Zelensky.

Israel x Hamas

A recente invasão da Faixa de Gaza não deve trazer consequências diretas ao Brasil neste primeiro momento. O país tem uma história de décadas de neutralidade no conflito e, ao mesmo tempo, tem volume relativamente baixo de comércio com o país do Oriente Médio.

Lula deseja solução amigável para o conflito

O governo Lula defende uma solução de dois Estados, que reiterou após a nova onda de ataques. Em nota, o Itamaraty condenou publicamente os ataques a Israel e reiterou um “compromisso com a solução de dois Estados, com Palestina e Israel convivendo em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas”.

O governo brasileiro também destacou que “a mera gestão do conflito não constitui alternativa viável para o encaminhamento da questão israelo-palestina, sendo urgente a retomada das negociações de paz”.

O Brasil já apresentou proposta na ONU para abertura de corredores diplomáticos e condenou os ataques do Hamas a Israel.

*Com informações do Exame, G1, Uol e Disparada

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