Campanha de última hora dentro de igrejas evangélicas pode ter ampliado votos de Bolsonaro, diz cientista política americana

O desempenho do presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) no primeiro turno das eleições pode ter sido influenciado por campanhas de última hora realizadas dentro de igrejas evangélicas, afirma a brasilianista e cientista política americana Amy Erica Smith, da Universidade Estadual de Iowa.

“É possível que a campanha dentro das igrejas ou nas redes sociais direcionada aos fiéis evangélicos tenha tido um papel relevante nos resultados”, diz a professora, que é autora do livro Religion and Brazilian Democracy: Mobilizing the People of God (Religião e Democracia Brasileira: Mobilizando o Povo de Deus, em tradução literal).

Segundo a cientista política, é comum que nos dias que antecedem o pleito ou no próprio domingo de votação, líderes religiosos defendam candidatos em seus sermões ou nas redes sociais.

“Com isso, pode haver mudanças de última hora em favor do candidato apoiado pelas igrejas”, afirmou à BBC News Brasil.”

Alguns chamam isso de clientelismo, mas não é bem por aí, porque não há necessariamente compra de votos. O que acontece é que muitas pessoas ainda estão indecisas e acabam tomando a decisão no último dia, influenciadas pelas igrejas”.

A eleição presidencial de 2022 será decidida em 30 de outubro, após um primeiro turno com uma diferença mais apertada do que previam as principais pesquisas de intenção de voto.

Com 99,9% das urnas apuradas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) obteve 48,43% do total dos votos válidos e Bolsonaro, 43,20%.

Pesquisas divulgadas nos dias anteriores à eleição mostram Bolsonaro com ampla vantagem sobre Lula entre eleitores evangélicos.

Na pesquisa Datafolha divulgada em 29 de setembro, o presidente ampliou sua vantagem numérica entre o grupo. Ele manteve os 50% registrados no levantamento anterior, mas viu Lula cair de 32% para 30% – uma diferença de 20 pontos porcentuais.

Nas redes sociais também são muitos os líderes e personalidades religiosas que apoiaram o atual mandatário.

Os evangélicos correspondem a cerca de 25% da população brasileira, de acordo com pesquisas de intenção de voto do Ipec.

Desconfiança nas pesquisas

Amy Erica Smith ressalta ainda a forma como as pesquisas de opinião não foram capazes de mensurar corretamente o apoio de Bolsonaro entre os eleitores brasileiros.

Na véspera do pleito, pesquisas Datafolha e Ipec mostravam Lula com ampla vantagem sobre Jair Bolsonaro nos votos válidos.

Na pesquisa Ipec, o petista tinha 51% dos votos válidos e o atual presidente, 37%. No Datafolha, Lula tem 50% dos votos válidos, contra 36% de Bolsonaro.

“Bolsonaro em vários momentos pregou certa desconfiança em relação às pesquisas. Isso pode ter feito com que alguns de seus eleitores não respondessem aos questionários e pesquisadores”, diz Smith.

“Mas as agências de pesquisa certamente passarão as próximas três semanas tentando entender o que deu errado – esse será o grande desafio”

Na opinião da cientista política, Lula ainda é favorito no segundo turno, mas a também ampla base de apoio de Bolsonaro pode representar problemas para o petista.

“O cenário atual é justamente o que Lula queria evitar”, diz.

“Muitas pessoas já diziam que se os resultados [dos dois candidatos] fossem próximos, seria mais fácil para Bolsonaro dizer que as eleições foram fraudadas. O fato das pesquisas terem subestimado o apoio a ele, pode fortalecer esse discurso.”

Reportagem da BBC Brasil mostrou que o mandatário já atacou o sistema de votação mais de 100 vezes. Durante a maior parte do seu mandato e da corrida eleitoral, Bolsonaro levantou dúvidas, sem apresentar evidências, de que a urna eletrônica não seria à prova de fraudes.

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