Se o dólar alto assusta quem pretende viajar para o exterior e pressiona a inflação, pelo aumento dos preços dos produtos importados, a queda da moeda norte-americana, que já se desvalorizou cerca de 15% ante o real neste ano, só pode ser boa para todos, certo? Nem sempre.
Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que a queda na cotação do dólar, na comparação com o real, afeta negativamente alguns setores da economia, principalmente os que necessitam exportar produtos para lucrar.
“De forma geral, com a queda do dólar ante o real, os exportadores perdem”, diz Paulo Dutra, professor de economia da Faap.
Os compradores lá fora continuam pagando a mesma quantidade em dólar, mas, quando o dinheiro é convertido para o real, os exportadores ganham menos.
Quem lucra são os importadores, pelo motivo contrário: tem de usar menos reais para pagar as mercadorias em dólar.
Soja, mineração, carne e papel perdem
Para Bruna Marcelino, estrategista-chefe da Necton Investimentos, os setores mais prejudicados pela queda do dólar são o de commodities agrícolas, como os exportadores de soja; mineração, de produtores de minério; proteína (empresas que vendem carne e frango); e companhias que produzem papel e celulose.
De acordo com Dutra, no entanto, as condições da economia que fazem com que o dólar perca força na comparação com o real podem não durar por muito tempo.
“Neste momento, olhando para questões que estão fazendo o dólar se desvalorizar, elas não indicam que a queda seja duradoura. Temos como fator positivo um aumento da demanda de commodities em função da saída da pandemia. No entanto, a China voltou com restrições por causa de casos de covid-19. Com esse fechamento das cidades e da economia chinesa, a demanda cai e se esfria a economia”, declarou.
“Além disso, há também uma expectativa de aumento de taxas de juros na Europa e EUA para tentar conter a inflação. Isso deve reduzir o crescimento”, declarou.
Dólar baixo ajuda contra a inflação
A queda do dólar tem seu lado muito bom. Além de reduzir o preço das viagens dos brasileiros para o exterior, a valorização recente do real na comparação com a moeda norte-americana pode ajudar o Brasil a desacelerar a inflação.
“Quando a gente observa as condições atuais, o fortalecimento do real ante o dólar tem ajudado a reduzir o impacto inflacionário.”
Isso ocorre porque as importações ficam mais baratas ou porque commodities, como o petróleo, são produzidas aqui, mas precificadas em dólar. Se real se valoriza, os preços sobem menos e a inflação fica mais controlada.
“Essa seria, atualmente, uma das grandes vantagens da valorização do real em relação ao dólar: reduzir o impacto inflacionário”, disse Paulo Dutra.
Além disso, companhias que tinham sido prejudicadas pela queda do real nos últimos anos podem se fortalecer agora.
“São as empresas que têm custos de matéria-prima em dólar, como aquelas que precisam do trigo para produzir seus produtos (bolacha, macarrão) e empresas de tecnologia, eletroeletrônicos e eletrodomésticos, que precisam de componentes importados”, afirmou Bruna Marcelino.
Segundo a economista-chefe, companhias que têm dívidas em dólar também podem ser beneficiadas pela alta do real.
“Um ponto de atenção são as empresas que possuem alto endividamento em dólar e que, por isso, se beneficiam da queda da moeda, porque isso também diminui o endividamento”, disse.