Embora continue liderando pesquisas de intenção de voto para o governo do Estado nas eleições de 2026, o prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena (sem partido) sofre intensa pressão para definir mais claramente sua posição no cenário político-eleitoral paraibano. Ele é desafiado a assumir papel de expoente do campo da oposição ao esquema do governador João Azevêdo (PSB), de quem se distanciou por causa da preferência do chefe do Executivo pela pré-candidatura do vice-governador Lucas Ribeiro (PP) à sua sucessão. A relutância de Cícero em confrontar a administração estadual agasta os adversários declarados de João Azevêdo, como o próprio senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB), avalista de uma possível filiação de Cícero ao partido e da sacramentação da candidatura dele ao Executivo. O senador Efraim Filho (União Brasil), adversário potencial de Lucena na disputa pelo governo em primeiro turno, tem ironizado que considera Cícero um dissidente, não um oposicionista à gestão de João.
A situação se complica com declarações do próprio deputado federal Mersinho Lucena, filho do prefeito, de que seu pai mantém o voto na pré-candidatura do governador João Azevêdo ao Senado, apesar de combater o candidato dele ao governo. Essa perspectiva incomoda o senador Veneziano Vital do Rêgo, que luta incansavelmente para ter um parceiro confiável na campanha ao Congresso, já que rechaça qualquer aliança com o bolsonarismo, que tem como um dos candidatos ao Senado o ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga (PL), ex-candidato a prefeito da Capital. Enquanto recorre à caneta de prefeito para exonerar ex-aliados de partidos como o Solidariedade que estão fechados com a postulação de Lucas, Cícero retarda o anúncio de definição sobre filiação partidária e não avança na estratégia de composição da chapa, o que inclui a questão do candidato a vice-governador e de outra vaga ao Senado. O jogo bruto que é travado nos bastidores e que faz parte da dinâmica política na preparação para o pleito vindouro já desperta impaciência do prefeito da Capital até com setores da imprensa, de quem reclama pela cobrança insistente sobre os rumos que irá tomar, embora a imprensa se limite a cumprir seu papel de dar espaço a fatos que estão moldando o panorama para o próximo ano. Para analistas políticos a impressão é de que Cícero precipitou-se na “virada de chave” que decidiu protagonizar e, além do mais, não tinha uma estratégia definida ou consistente para comandar uma ruptura ou divisor de águas. Um político da base de João comenta que Lucena quer operar um parto sem dor, ignorando que em política as paixões são acirradas, sobretudo nestes tempos de polarização que, a nível local, seguem a dinâmica da conjuntura nacional, onde o enfrentamento se dá entre bolsonaristas e lulistas. A realidade da Paraíba é um microcosmo da realidade nacional, naturalmente com outros interesses no radar, adaptados às peculiaridades paraibanas.
Um outro ponto que precisa ser destacado é que Cícero sentiu-se vulnerável com a desativação gradual da parceria exitosa que vinha sendo mantida entre a gestão municipal e a administração do governador João Azevêdo e que contribuiu decisivamente tanto para a eleição do prefeito em 2020 como para a sua reeleição em 2024, mediante o empenho dos liderados do chefe do Executivo estadual nas batalhas eleitorais vencidas por Cícero. João sufocou o próprio movimento surgido dentro do PSB em favor de uma candidatura própria a prefeito para poder manter o compromisso com Cícero, e avalia que, no momento da reciprocidade, não foi correspondido. Este é o ponto que alimenta as discussões e troca de acusações entre partidários de João e partidários de Cícero, no rescaldo de uma história de convivência que chegou ao fim.
A parceria administrativa, em si, não está interrompida, até porque lá atrás muitos projetos e obras foram concebidos em articulação estreita entre governo estadual e prefeitura. Mas o ritmo agora é lento, os canais de diálogo já não são mais acessíveis, os secretários não sentam à mesa com a cordialidade que até então reinava. A ruptura chegou numa hora errada para Cícero, quando ele tem programas pendentes a executar, enfrenta críticas por iniciativas mal planejadas como a operação da Zona Azul no Centro Histórico de João Pessoa e vai perdendo a perspectiva de poder, não obstante manter a prefeitura sob controle. A máquina municipal, porém, é ofuscada pelo volume de obras e investimentos da máquina estadual pilotada por João, em praticamente todas as regiões do Estado. Dá-se, também, que o modelo de gestão de Azevêdo foi repetidas vezes elogiado por Cícero, que agora tem dificuldades para dar credibilidade ao discurso de oposição. São muitos os flancos abertos na logística de Cícero quanto a uma campanha para o governo. A liderança dele nas pesquisas é indiscutível e fundamental, mas não é tudo, e pode decair se ficar comprovado para a opinião pública que a gestão de Cícero não tem muito o que oferecer, sobretudo em termos de inovação, no quarto mandato que ele exerce na prefeitura. O próprio tom de Lucena é de fastio, na análise clínica de “experts” do jogo político local.