PEC da Blindagem: relator dá parecer contrário à proposta, que deve ser enterrada nesta quarta

Emenda constitucional é o primeiro item da pauta de hoje na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Presidente do colegiado e relator da matéria adiantaram que proposta não avança

A Comissão de Constitucional e Justiça do Senado deve colocar um ponto final, hoje, à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2021, a PEC da Blindagem, que propõe que apenas com aval da Câmara ou do Senado possam ser abertos processos criminais contra os parlamentares. O presidente da CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA), incluiu a proposta como primeiro item da pauta e sinalizou que a tendência é de que seja integralmente rejeitada — tal, inclusive, como já adiantou o relator da matéria, senador Alessandro Vieira (MDB-SE).

Otto conversou com outros colegas e garante ter conseguido um número significativo de votos contrários à proposta — segundo ele, 18 no colegiado e cerca de 50 no Plenário, caso a proposta consiga avançar. Para o senador, as manifestações de domingo definiram o futuro da PEC. “A voz do povo é a voz de Deus. Nunca vi, a não ser talvez nas diretas, muitos jovens nas ruas. E vi agora, nessa manifestação espontânea. Os jovens estão se levantando e entendendo que não pode retroceder a um passado obscuro”, observou.

Ontem, parlamentares do PSol entregaram ao presidente da CCJ mais de 1,5 milhão de assinaturas contra a PEC. O documento será protocolado para reforçar a pressão pela rejeição.

Da mesma forma, a seção do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil aprovou, por unanimidade, um parecer jurídico contrário à PEC. O documento recebeu 116 votos favoráveis no Conselho Pleno e consolidou a posição da entidade contra o que classifica como “a volta de privilégios que ampliam a imunidade parlamentar e afrontam o princípio republicano”. O documento foi entregue pessoalmente a Alessandro Vieira pelo presidente da OAB-PR, Luiz Fernando Casagrande Pereira.

Entre os parlamentares, o repúdio à proposta é generalizado. O senador Beto Faro (PT-PA) classificou-a como uma excrescência política, enquanto que a senadora Zenaide Maia (PSD-RN) considera que a PEC “significa proteger quem comete malfeitos, proteger quem usa um cargo político para cometer crimes”.

Mas isso não quer dizer que a proposta não tenha defensores. Tal como o senador Dr. Hiran Gonçalves (PP-RR) . “A atividade parlamentar só pode ser plena quando exercida sem receio de retaliação ou de perseguição”, explicou. Outro defensor da PEC é o deputado Alberto Fraga (PL-DF). “Votamos para restaurar as prerrogativas que tínhamos em 1988”, afirmou.

Do PL escutou que só interessa “descondenar” a todos, inclusive o ex-presidente Jair Bolsonaro, punido pelo STF com 27 anos e três meses de prisão. Do Republicanos, porém, há adesão à possibilidade de se rever as penas, mas mantendo as condenações. Paulinho explicou que pretende construir uma proposta “de meio-termo”.

“Estou ouvindo todos os partidos e pretendo preparar um relatório que possa agradar à maioria do Congresso e também ao povo brasileiro. A ideia é reduzir as penas e permitir que a grande maioria dos presos possa sair da cadeia. É nesse caminho que estamos trabalhando. No meu texto vai estar a redução de penas. Quem vai decidir se isso é dosimetria ou não é o Supremo”, explicou.

Se, de um lado, o PL não aceita nada menos do que liberar a todos, para o Palácio do Planalto tal hipótese é impensável. A ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, reuniu-se com o presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) e deixou claro que não haverá concessão.

“Vamos contra a anistia. Votamos contra o requerimento de urgência e, se houver projeto nesse sentido, o governo votará contra, assim como votará contra qualquer tentativa de redução de penas”, frisou. Ela salientou que o STF julgou os casos dentro das regras processuais e que ainda há recursos em andamento. “Não há por que mexer no processo”, disse.

Anistia chega ao impasse

As negociações sobre a anistia aos condenados pela tentativa de golpe de Estado chegaram, ontem, ao impasse. O deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator do rebatizado “PL da Dosimetria” — ninguém seria abonado dos crimes que cometeu, mas as penas impostas pelo Supremo Tribunal Federal poderiam ser revistas —, se reuniu com bancadas dos partidos no sentido de tentar construir um consenso. Mas o esforço de pouco adiantou.

“A única coisa que o Congresso pode fazer é mudar a lei. A lei diz, por exemplo, que a pena será de dois a seis anos, de quatro a oito anos, de quatro a 12. O que a gente pode é dizer que o artigo passa a valer então de dois a cinco, de dois a três, de dois a quatro. O Supremo Tribunal vai interpretar isso. Na medida que você muda, o Supremo refaz a dosimetria”, disse Paulinho, evitando rebater o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), que disse na segunda-feira que o debate “começou mal” por ter como participantes o ex-presidente Michel Temer e o deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG), adversários políticos do PT.

Alguns elementos, porém, passaram a influir na dificuldade de se fechar algum acordo. O principal deles são as manifestações de domingo passado, que no Rio de Janeiro e em São Paulo reuniram mais de 40 mil pessoas contra a anistia e a PEC da Blindagem. Nos bastidores do Congresso, parlamentares do Centrão até então favoráveis a liberar os golpistas reconheceram que se surpreenderam com o tamanho dos protestos e passaram a admitir a possibilidade de rejeitarem o PL.

Também passou a pesar contrariamente a rejeição de Hugo Motta ao pedido da oposição para que o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) assuma a liderança da Minoria. O líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), anunciou que recorreria à Mesa Diretora da Casa para que confirmasse ou não a decisão do presidente.

Outro fator para o impasse da anistia é a inclusão da mulher do ministro Alexandre de Moraes, do STF, na lista de sanções da Lei Magnitsky. Se antes havia alguma simpatia entre os magistrados da Corte pelo “PL da Dosimetria”, conforme se comentava nos bastidores, com a nova decisão do governo norte-americano tal boa vontade se desfez.

Motta, por sua vez, afirmou que a discussão sobre a anistia seguirá o rito regimental e só avançará depois de ser apresentado o texto. “O deputado Paulinho está conversando com os líderes. Apenas depois dessas conversas é que vamos definir a pauta desse assunto”, enfatizou. Ele ressaltou que o impasse em votações não afeta apenas a anistia, mas, também, projetos estratégicos para o governo, como a proposta sobre a redução do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, discutida com a ministra da Gestão, Esther Dweck, e com o ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).