Ícone do site Blog Gutemberg Cardoso

Quais são os próximos passos após defesa de Bolsonaro prestar esclarecimentos a Moraes

Caso Moraes avalie que o ex-presidente descumpriu as cautelares, cabe o decreto de prisão preventiva

A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) prestou esclarecimentos nesta terça-feira, 22, sobre o descumprimento das medidas cautelares impostas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Os advogados do ex-presidente alegaram que Bolsonaro não tinha conhecimento da proibição de conceder entrevistas, pois a restrição, segundo a defesa, só ficou expressa em um despacho posterior do ministro, e prometeram que o ex-presidente seguirá sem se manifestar.

Com a manifestação dos defensores, Moraes decidirá se Bolsonaro descumpriu as medidas cautelares a que está submetido desde sexta-feira passada, dia 18. Antes da decisão, o ministro pode pedir uma manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR). Caso Moraes avalie que o ex-presidente descumpriu as cautelares, cabe o decreto de prisão preventiva. Não há prazo para essa análise.

Bolsonaro foi submetido a cinco medidas restritivas. O ex-presidente passou a usar tornozeleira eletrônica, deve cumprir um recolhimento domiciliar e foi proibido de se comunicar com diplomatas, embaixadores estrangeiros e outros réus ou investigados. A medida cautelar que causa o impasse é a proibição de acessar redes sociais.

Na segunda-feira, 21, Bolsonaro foi à Câmara e deu declarações públicas ao lado de aliados, que transmitiram o conteúdo do encontro em suas redes sociais. Em um despacho no mesmo dia, Moraes afirmou que a proibição de acessar redes inclui, “obviamente”, retransmissões da imagem de Bolsonaro. Para criminalistas ouvidos pelo Estadão, sem diretrizes claras, a medida pode configurar censura prévia.

Ao divergir da imposição de medidas cautelares a Bolsonaro, o ministro Luiz Fux avaliou que a restrição de acesso a redes poderia atentar contra o direito à expressão do réu. Fux foi vencido pelos demais membros da Primeira Turma do STF.

Base para prisão de Bolsonaro gera divergências, e Moraes é alvo de críticas

A interpretação que Moraes está fazendo da medida cautelar imposta por ele mesmo de “proibição de uso de rede social” é muito expansiva

A decisão em que o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal) ameaçou decretar a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), gera divergências entre especialistas consultados pela Folha de S.Paulo.

Entre os que criticam a decisão, expedida na segunda-feira (21), há o entendimento de que a interpretação que Moraes está fazendo da medida cautelar imposta por ele mesmo de “proibição de uso de rede social” é muito expansiva.

A discussão principal é se posts feitos por terceiros, sem qualquer evidência de conluio com Bolsonaro, poderiam ser caracterizados como uma violação dessa restrição por parte do ex-presidente. Há críticas também no sentido de que a decisão não traz detalhamento ou elementos mínimos para fundamentar o suposto descumprimento.

Quem defende a decisão vê a medida como necessária frente a forma como os ataques ao STF têm sido engendrados via redes sociais e que o ministro já teria elementos para decretar a prisão preventiva.

Na sexta-feira (18), Moraes determinou diversas medidas cautelares alternativas à prisão contra Bolsonaro, como uso de tornozeleira eletrônica e proibição de uso “redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros”.

Depois de dizer, em ordem na segunda-feira, que essa restrição incluía transmissões, ou retransmissões de entrevistas “em qualquer das plataformas das redes sociais de terceiros”, Moraes intimou a defesa do ex-presidente a prestar “esclarecimentos sobre o descumprimento das medidas cautelares impostas, sob pena de decretação imediata da prisão do réu”. A decisão de Moraes reproduz cinco posts, entre eles um do jornal O Estado de S. Paulo e dois de Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que também é investigado.

Nesta terça-feira, a defesa de Bolsonaro afirmou no processo que ele não descumpriu as medidas e pediu a Moraes que esclareça se o ex-presidente pode conceder entrevistas.

A advogada criminalista e vice-presidente do Iasp (Instituto dos Advogados de São Paulo), Marina Coelho Araújo, avalia que não haveria embasamento para prender Bolsonaro por descumprimento das medidas cautelares.

“Ele pode ir no Congresso, porque ele não está proibido -ele está proibido de ir nas embaixadas. E ele não está proibido de falar com jornalista”, diz ela. “O fato de o jornalista colocar isso na rede social não é, a meu ver, utilização na rede social indiretamente por Bolsonaro. É uma notícia que está sendo dada por um jornal.”

Para ela, as decisões de Moraes até esta segunda estão dando uma interpretação muito expansiva dessa proibição de utilização de redes sociais e que ela deve ser entendida como dizendo respeito apenas a Bolsonaro. “O que ele [Moraes] está obrigando aqui é o Bolsonaro a não se valer de terceiras pessoas. Por exemplo, eu uso uma conta da rede social do meu amigo ou do outro para fazer alguma publicação. Isso ele não pode fazer.”

Das medidas cautelares contra Bolsonaro, ela vê a obrigação de uso de tornozeleira eletrônica como bem aplicada. Mas critica a restrição de uso das redes, por avaliar que o processo em tramitação sobre a trama golpista não está correndo risco.

Já o advogado criminalista Hugo Leonardo, ex-presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e membro do grupo de advogados Prerrogativas, defende que a atuação de Bolsonaro do que entende serem ataques à corte já justificariam uma medida ainda mais gravosa, que seria a decretação de prisão preventiva.

Ele entende, de modo geral, que apenas as cautelares previstas em lei poderiam ser aplicadas no âmbito penal. Apesar disso, defende que, no caso de Bolsonaro, a restrição ao uso das redes estaria correta -critica por outro lado, a proibição de contato entre o ex-presidente e seu filho Eduardo.

“Este é um caso cujo cometimento do crime tem sido justamente por meio desses artifícios de mobilização da opinião pública de falseamento da verdade, então não dá para gente deslocar a forma como esse crime foi cometido e tem sido discutido no STF com o meio pelo qual esses atores atuam”, diz.

Leonardo defende que posts da imprensa da passagem de Bolsonaro pela Câmara não violaram a medida que foi imposta por Moraes, mas sim a própria cena que ocorreu. “Houve uma cena construída, ele levanta a calça, mostra a tornozeleira e fala em humilhação suprema, dizer que isso não é um ataque ao Supremo, eu não sei mais o que é.”

Francisco Monteiro Rocha, advogado e professor de direito penal da UFPR (Universidade Federal do Paraná), vê com preocupação a decisão de Moraes ameaçando o ex-presidente de prisão, incluindo post até mesmo da imprensa.

“Eu acho isso bastante temerário”, diz. “Então, qualquer pessoa que fale qualquer coisa do Bolsonaro, em qualquer momento, vai fazer com que ele seja preso?”

Para Rocha, um post, por exemplo, da esposa do investigado com um vídeo ele seria um caso com maior possibilidade de se entender que há um uso de rede social de terceiro, como foi vetado por Moraes inicialmente. Ele avalia que os casos citados na decisão não parecem ser “suficientemente lastreados em elementos de prova mínima”.

“É muito difícil você estabelecer aí esse nexo do dolo, da vontade de fazer com que a sua palavra seja reverberada por terceiros sem que isso não esbarre no direito de se manifestar, no direito de conceder entrevistas”, argumenta ele.

A advogada Tatiana Stoco, que é professora de direito e processo penal do Insper, vê a decisão de Moraes desta segunda como pouco específica.

A partir da decisão de Moraes anterior, ela entende que, em caso de haver apenas retransmissão por parte de algum veículo sem que haja uma articulação do ex-presidente para essa divulgação, isso não poderia justificar uma prisão preventiva. Pois, diz ela, a medida cautelar é dirigida pessoalmente àquele que é investigado.

Outro caso, diz ela, seria a situação em que Bolsonaro faça articulações para promover as retransmissões, mas adenda que a decisão de Moraes não traz fundamentação a esse respeito.

“Se ficar demonstrado no caso que ele [Bolsonaro] está articulando para isso, que ele está proibido, ele está descumprindo aquela proibição”, diz ela.

Sair da versão mobile