Após a leitura da denúncia, os advogados vão apresentar as defesas e, depois os cinco ministros do colegiado vão decidir se tornam réus, ou não
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar nesta terça-feira, 20, a denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra mais um núcleo que integra o inquérito do golpe de Estado.
O “núcleo 3″, acusado de planejar “ações táticas” para efetivar o golpe, é composto por militares da ativa e da reserva do Exército e por um policial federal. São eles: Bernardo Romão Correa Netto (coronel); Cleverson Ney Magalhães (coronel da reserva); Estevam Cals Theóphilo Gaspar de Oliveira (general da reserva); Fabrício Moreira de Bastos (coronel); Hélio Ferreira Lima (tenente-coronel); Márcio Nunes de Resende Júnior (coronel); Nilton Diniz Rodrigues (general); Rafael Martins de Oliveira (tenente-coronel); Rodrigo Bezerra de Azevedo (tenente-coronel); Ronald Ferreira de Araújo Júnior (tenente-coronel); Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros (tenente-coronel); e Wladimir Matos Soares (agente da Polícia Federal).
O presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin, reservou três sessões para o julgamento: no dia 20, às 9h30 e às 14h, e no dia 21, às 9h30. Após a leitura da denúncia, os advogados vão apresentar as defesas e, depois disso, os cinco ministros do colegiado vão decidir se tornam réus, ou não, os 12 denunciados.
Quem são os acusados
Bernardo Romão Correa Netto é coronel do Exército. Segundo o relatório da Polícia Federal (PF), Correa Neto era um “homem de confiança” do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, e estava envolvido no planejamento do golpe de Estado. Ele teria sido o intermediador de uma reunião entre militares que planejavam uma medida golpista em novembro de 2022, logo após a derrota do ex-presidente nas eleições.
Cleverson Ney Magalhães é tenente-coronel e ex-oficial do Comando de Operações Terrestres (Coter). Os elementos da investigação apontam que o general Estevam Theóphilo teve o apoio do coronel Cleverson Ney Magalhães, seu assistente no Coter. O militar foi o responsável por organizar um encontro para discutir com os “kids pretos” os atos preparatórios para a intervenção.
Estevam Theóphilo é general do Exército. As investigações apontam que ele teria usado a alta patente que possuía para “influenciar e incitar apoio aos demais núcleos de atuação por meio do endosso de medidas a serem adotadas para consumação do golpe de Estado”. O ex-chefe do Coter integrava o núcleo de oficiais de alta patente com influência e apoio aos demais cinco núcleos do grupo investigado pela PF.
Fabrício Moreira de Bastos é coronel do Exército. Fabrício, segundo a PF, é um dos autores da carta aberta que buscava angariar apoio para o golpe entre oficiais das Forças Armadas. Além disso, de acordo com a investigação, foi responsável pelo agenciamento de “kids pretos” dispostos à intentona. Na época dos fatos investigados, ele atuava no Centro de Inteligência do Exército.
Hélio Ferreira é ex-comandante da 3.ª Companhia de Forças Especiais em Manaus. Foi destituído de sua posição em fevereiro de 2024, durante investigações sobre planos antidemocráticos relacionados ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Quando convocado a depor à Polícia Federal sobre sua suposta ligação com o golpe de Estado, optou por permanecer em silêncio. Com formação em Operações Especiais, é membro do grupo de elite do Exército conhecido como “kids pretos”, especializado em missões sigilosas de alto risco.
Márcio Nunes de Resende Júnior é coronel do Exército. Foi flagrado pela PF nas conversas em grupo de WhatsApp de planejamento do golpe. Comandou o 1.º Batalhão de Logística de Selva. Também das Forças Especiais, ele estava no Estado-Maior do Exército quando participou do grupo de WhatsApp, onde ocupa atualmente a Comissão Permanente de Avaliação de Documentos Classificados (CPADC).
Nilton Diniz Rodrigues é coronel do Exército, foi promovido a general da Força Terrestre. Era assistente do general Freire Gomes, então comandante do Exército, e teria tentado convencê-lo a aderir ao golpe. Segundo a PF, Nilton foi o “responsável por articular e marcar a reunião realizada na data de 28 de novembro de 2022, em Brasília, que teve o objetivo de executar ações voltadas a pressionar os comandantes do Exército a aderirem ao golpe”.
Rafael Martins De Oliveira. O tenente-coronel do Exército compunha o grupo de militares chamados de “kids preto” e participou da elaboração do plano de golpe apresentado em novembro de 2022 na casa do general Walter Braga Netto. Uma de suas tarefas foi monitorar as ações do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que seria assassinado caso o intento golpista tivesse sucesso.
Rodrigo Bezerra De Azevedo é tenente-coronel do Exército. Segundo a PF, o grupo criminoso usou técnicas de anonimização na tentativa de esconder os verdadeiros donos dos telefones rastreados. Os “telefones frios”, de acordo com a investigação, são aparelhos comprados e cadastrados com dados de outras pessoas para dificultar ou impedir a identificação. Um dessas linhas foi registrada pelo tenente-coronel Rodrigo Bezerra 14 dias após a ação que pretendia sequestrar e executar o ministro Alexandre de Moraes, no dia 29 de dezembro de 2022.
Ronald Ferreira De Araújo Júnior, tenente-coronel do Exército, foi um dos autores do “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, manifesto em que o grupo criminoso convoca militares de alta patente a aderirem ao intento golpista. O oficial também atuou na coleta de assinaturas para o documento.
Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, coronel do Exército, coletou assinaturas de militares para a “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, em que o grupo conclamou oficiais de alta patente a se juntarem ao plano golpista. O manifesto seria intencionalmente vazado pelo influenciador Paulo Figueiredo, neto de João Paulo Figueiredo, presidente do Brasil durante a ditadura militar.
Wladimir Matos Soares, agente de Polícia Federal, forneceu informações sobre a segurança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao grupo golpista. Ele chegou a informar ao então assessor pessoal de Jair Bolsonaro Sérgio Cordeiro a localização do sargento Misael Melo da Silva, que integrava a equipe do petista. Soares também demonstrou por meio de mensagens disposição em participar ativamente para impedir a transição de poder. “Eu e minha equipe estamos com todo equipamento pronto p ir ajudar a defender o Palácio e o presidente. Basta a canetada sair!”.
Quem já foi julgado
A PGR fatiou a denúncia de tentativa de golpe em cinco núcleos. Até agora, os ministros da Primeira Turma já julgaram e aceitaram as denúncias contra o “núcleo 1″ ou “núcleo crucial”, do qual ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados próximos fazem parte, do “núcleo 2″ ou “núcleo de gerência” e do “núcleo 4″, acusado de atuar na produção e disseminação de desinformação e ataques ao sistema eleitoral
Em 26 de março, Bolsonaro e outros sete se tornaram réus por tentativa de golpe de Estado. O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, votou para aceitar a denúncia da PGR, e foi seguido por Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, presidente do colegiado. Esse grupo é considerado o “núcleo crucial” da tentativa golpista, pois “deles partiram as principais decisões e ações de impacto social” para a conspiração.
Além de Bolsonaro, são réus o general Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa e Casa Civil), general Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional), deputado Alexandre Ramagem (ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), almirante Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), general Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e tenente-coronel Mauro Cid (ex-ajudante de ordens da Presidência).
No julgamento do “núcleo 2″, em 22 de abril, os ministros também aceitaram a denúncia e tornaram réus os seis integrantes do grupo: Fernando de Sousa Oliveira, Filipe Garcia Martins, Marcelo Costa Câmara, Marília Ferreira de Alencar, Mário Fernandes e Silvinei Vasques. Esse grupo é considerado o “núcleo de gerência”, pois todos os integrantes tinham “posições profissionais relevantes” no governo e “gerenciaram as ações” golpistas, segundo a PGR.
Já o “núcleo 4″ da suposta trama golpista, acusado de atuar na produção e disseminação de desinformação e ataques ao sistema eleitoral, é composto por Ailton Gonçalves Moraes Barros, Ângelo Martins Denicoli, Carlos César Moretzsohn Rocha, Giancarlo Gomes Rodrigues, Guilherme Marques de Almeida, Marcelo Araújo Bormevet e Reginaldo Vieira de Abreu. O STF aceitou a denúncia no dia 6 de maio deste ano.
Núcleo 5
O “núcleo 5″ da denúncia é composto apenas pelo ex-apresentador da Jovem Pan Paulo Figueiredo. Como mostrou a Coluna do Estadão, Figueiredo deve ser o primeiro réu julgado à revelia no STF no processo da trama golpista. O investigado não apresentou defesa e deve continuar assim, segundo interlocutores da Corte.
Neto do general João Batista Figueiredo, último presidente da ditadura militar, ele foi denunciado no inquérito do golpe há três meses, mas ainda não se defendeu no processo.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou que Figueiredo usou sua “capacidade de penetração no meio militar” em programas de rádio e TV para amplificar “ataques pessoais (contra generais) e aumentar a adesão (ao golpe)”.